quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Presos em uma câmara de vácuo!

Um dos efeitos negativos da solidão é justamente a sensação de ausência, de vacuidade da vida, de inquietação interior. Isso foi bem capitado por Graciliano Ramos, no seu poema "Solidão": "As janelas estão fechadas. Meia Noite. Nenhum rumor na casa deserta. Levanto-me, procuro uma vela, que a luz vai apagar-se. Não tenho sono. Deitar-me, rolar no chão até a madrugada, é uma tortura. Prefiro ficar sentado, concluindo isto. Amanhã não terei com que me entreter. (...) É horrível! Se aparecesse alguém... Estão todos dormindo. Se ao menos a criança chorasse... Nem sequer tenho amizade a meu filho. Que miséria! (...) e vou ficar aqui, as escuras, até não sei que hora, até que, morto de fadiga, encoste a cabeça à mesa, e descanse uns minutos."
Se der uma olhadinha no dicionário, vai ver que vácuo é algo que não tem nada, oco, despejado, vazio, espaço imaginário ou real, não ocupado por coisa alguma, e que ausência é agastamento, falta, carência, inexistência. As pessoas atualmente são excessivamente ausentes e "empacotadas a vácuo", solitárias.
Todos já nos sentimos sós. Já experimentamos e vamos continuar vivenciando a solidão em momentos de nossas vidas. Não negamos isso. Nos sentimos sós pela perda de um ente querido (e como isso dói, mas, graças a Deus, porque somos seres humanos), ainda que essa pessoa só "morra" para nós e não para os outros; por traições que sofremos, pela perda de um emprego, por não conseguirmos realizar o que idealizávamos (e é síndrome dos "sonhos frustrados") porque sucumbimos a vício ou a uma doença, e, principalmente, quando somos agentes e alvos dos "destituidores" de esperanças. Morre a esperança, morre o homem. Instala-se a solidão (vácuo e ausência). Com isso, cresce uma das maiores religiões da atualidade: a religião dos "Lexotans", dos Diasepans", dos "Prozacs" e tantos outros antidepressivos que você possa imaginar (Nada contra ao uso de remédios, se for realmente necessário, use, porém com cuidado: ele pode estar falsificado!). A angústia, o terror, a solidão da sociedade e a sociedade da solidão. Esse senso de vazio na alma, de abandono, de falta de propostas que dão sentido ao ato de viver, consome muita gente atualmente. é uma oportunidade também (vamos refletir), para perceber que muito da proposta cristã da atualidade, destituída que está de uma identidade pautada nos princípios das Escrituras, tem jogado muitas igrejas, e muitos jovens Cristãos num "vácuo espiritual", num " buraco negro" ( e você saber que a própria luz não consegue escapar da ação dessa estrutura cosmológica). Talvez seja por isso que muitos templos e muitos cultos têm se tornado em verdadeiras "Catedrais da Solidão" a "Eclesiologia da Angústia".
Agora, a Bíblia também é um livro da solidão. Se pensarmos em Jacó, usurpador de si próprio; na de Moisés, que muitas vezes teve a sensação de ter só o deserto por companhia, mais muito mais, encarnou sobre si a solidão, a angústia, e as crises de todo um povo, a solidão daqueles que se fizeram voz profética, seja Elias na caverna, Jonas no ventre do grande peixe, Isaías no palácio real, Ezequiel em um "vale de ossos secos", Daniel com os leões, e daí por diante. Até mesmo Jesus, que teve a coragem para pedir ao Pai que afastasse dele o cálice (Marcos14.33-36), num momento de solidão e angústia tremenda (Marcos 14.33-34). Mas, muito mais do que da solidão, a Bíblia é um livro que trás presença à ausência. Traz Deus até nós, e nós até Ele. Por terem toda essa percepção, os homens citados acima venceram alguns "vácuos" pelos quais passaram.
O Salmo 16.11 afirma que na presença de Deus há plenitude de alegria. Jesus disse que estaria conosco todos os dias até a consumação dos séculos (Mateus 28.20). Isso significa todos os dias mesmo! (a palavra grega é Heméra, que quer dizer diariamente) e consumação dos séculos" (no grego suteleías tou aiônos) não é algo somente direcionado para o futuro, para a eternidade, mas é para este mundo também, para esta vida presente. É para sua existência. Vale dizer que Cristo se faz presente em sua ausência, em sua solidão, alimentando-o nos seus momentos de angústia e restaurando os seus propósitos e suas aspirações. Já dizia Rubem Alves: "Vale a pena suportar a dor da ausência pela alegria do reencontro". Contextualizando, diria que vale a pena passar e suportar a solidão pautado e substanciado em Cristo Jesus para ter sempre um reencontro com Deus e consigo mesmo (seus valores e ideais), e daí fica fácil perceber que a solidão não tornará o vazio, existencialmente falido.
Deus te abençoe!

By Midiguiduga

2 comentários:

Edu Ywama (Tchintcha) disse...

Primeiramente sou seu fã pelas riqueza em suas palavras tão profundas...
Segundo, seu texto aborda um questão realmente que mexe muito comigo, sabe disso, já lhe disse... sou praticamente um eremita (ou heremita?!) pois o vácuo, a ausencia, vai e volta, intensifica e some... mas no fundo parece sempre Deus em minhas orações e pensamento, nunca me deixam só...
Terceiro, Midiguiduga, você uma pessoa especial! muito! bjsss Midi(o)

Licya de Sousa. disse...

Midi,

Vc é tão profunda escrevendo, adorooooooo!!!! Fiquei sensibilizada e com vontade de ler a Bíblia mais e mais!